Imagine uma vida na qual você pode ir para qualquer festa, qualquer lugar, sem ser convidado e só sua presença já torna daquilo um evento único, uma experiência inesquecível para os envolvidos. Parece surreal, mas essa é a vida de uma celebridade, o seu rosto possui valor. Muitas vezes a fama, o dinheiro e o sucesso acabam alterando a personalidade de um artista, criando um conflito interno em relação ao seu ego.

O sociólogo Charles Cooley teoriza que o nosso ego é na verdade formado pela nossa percepção do que os outros pensam de nós. A teoria supõe que por meio da socialização, não importa qual, nós espelhamos o nosso comportamento de acordo com a reação das pessoas no meio. Ele intitula o efeito como “looking glass self”.

Agora imagine o espelho de uma celebridade, sempre presente, constante e com opiniões bem evidentes. Como a mídia julga o artista acaba o afetando, as críticas, os elogios, os fãs, os comentários todo refletem e impactam a atitude da pessoa. É como se uma celebridade sempre tivesse um alter-ego, o ego midiático e o seu próprio ego. A identidade acaba ficando distorcida, com a versão midiática sobrepondo a “original”.

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Um estudo de 1989, feito pelos etnógrafos Patricia e Peter Adler condiz com a teoria de Charles Cooley. Os indivíduos observados foram atletas de basquete colegial. Por 5 anos, foi observado praticamente o mesmo ocorrido: quanto mais fama girava em torno deles, mais eles mudavam. A repercussão dos fãs e do meio os transformava naquele personagem criado pelos outros, os tornando egocêntricos e metidos. O artista, comediante e músico “Bo Burnham” representa muito bem como ele se sente em relação à isso na música abaixo.

Bo não é o único que se sente assim, com muitos artistas que passam pelo mesmo. Existe uma pressão para que a personalidade fora das câmeras seja a mesma que a midiática. Muito da vida de artistas não é disponível ao público, portanto performance e audiência acabam se misturando. O comediante discute isso em um de seus monólogos.

As palavras de Burnham lembram muito as do sociólogo Erving Goffman em sua obra “A representação do eu na vida cotidiana”. De acordo com ele, nós somos todos atores, o tempo todo para tentar controlar e gerenciar nossa imagem pública. Nós agimos de acordo com o que outros podem achar de nós. Isso acaba se tornando mais evidente em celebridades, devido à repercussão de suas ações.

“Você só deve acreditar por volta de 90% do que eu digo. Na verdade, não acredite em nada que eu digo. Eu posso estar completamente brincando com você, e o mundo, o tempo todo.” – Kanye West.

Apesar disso, sempre existe a possibilidade de realmente, a celebridade ser um egomaníaco. Mesmo que não seja uma performance, tais atitudes também podem ser explicadas. O filósofo “Max Stirner”, que na verdade é Johan Casper Schmidt, define o egoísmo em sua obra mais importante: O único e sua propriedade.

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Seus argumentos são de que na verdade o egoísmo existe para o “governo próprio” ou “liberdade pessoal”. Pois sem o egoísmo, nunca estaríamos livres, já que sempre que reprimimos nossa liberdade o motivo vem de outra pessoa ou meio. Toda vez que a liberdade é reprimida, você estaria sendo um escravo para os fins de outra pessoa, desvalorizando seus próprios. Seja desobedecer ou não seguir certas normas, sejam seus pais, o governo ou a religião, você estaria sendo egoísta.

O egoísta acredita que tudo existe para seu consumo e uso próprio, para seus próprios meios. Justificando atitudes como mentir, roubar ou trair. Todas julgadas como imorais. Mas, claramente, o filósofo não se importa com isso.

“Quem vai ser livre deve o fazer livre. Liberdade não é um presente fantasioso a cair no colo de um homem. O que é liberdade? Ter o desejo de ser responsável pelo ego próprio”

“Onde o mundo vem da minha maneira – e vem da minha maneira em todo lugar – Eu o consumo para quietar a fome de meu egoísmo. Para mim você não é nada – apenas minha comida, assim como eu também sou alimentado e virado para seu uso. Nós temos apenas uma relação, a de utilidade , de uso. Não devemos nada um ao outro, para aquilo que pareço lhe dever eu devo mais para mim mesmo. Se eu lhe mostrar um ar alegre para também te alegrar, então sua alegria é de consequência a mim, e meu ar serve meu desejo; para outros milhares, que não desejo alegrar, eu não o mostro.”

De qualquer modo, sejam essas teorias válidas ou não, sejam as celebridades vítimas de um conflito de egos ou apenas egoístas como Max Stirner; existe muito a ser indagado e questionado sobre a vida incompreensível causada pela fama.

Viciado em games, viciado em futebol, viciado em cinema, viciado em séries e viciado em drogas pesadas: leite, glúten e anime.