O fenômeno por trás da produção com certeza vai ser utilizado como referência daqui para frente, ilustrando como chamar o público de volta para os cinemas nesse clima pós-pandêmico. Agora, como conjunto da obra, deve ser a primeira vez que eu vejo um filme e não tive muitas palavras para descrever a sensação do que rolou na hora. São tantos sentimentos acumulados que parece aquela cena de Ratatouille (2009), quando o Remy come um pedaço de queijo, depois come um pedaço de morango e depois junta os dois. 

Nesse caso, o queijo seria o humor do filme, que de uma forma bem elaborada, cutuca, de maneira inteligente, em momentos delicados, sendo possível perceber que foi feita com muito cuidado e timing certo. Seguido por uma jornada filosófica de autoconhecimento da protagonista, a Barbie Estereotipada (Margot Robbie), que, enquanto todas as outras bonecas têm seus propósitos e carreiras, ela é apenas uma Barbie, representada pelo morango nessa metáfora. Tem uma estrutura de roteiro que é possível de ser destrinchada, já que mostra aquela famosa dinâmica de uma personagem que quer mudar no começo, mas, no final, acaba ganhando o que precisa e mudando sua visão de mundo, e, algumas vezes, sua personalidade. 

E o que seria a mistura desses do morango com queijo? A mensagem que o longa traz, que enaltece o papel das mulheres no mundo, onde não se deve existir um propósito a ser seguido para ser alguém no mundo, podendo literalmente ser você mesma. Impossível deixar de destacar como todos os Kens (principalmente Ryan Gosling) são extremamente descartáveis dentro da Barbieland, e isso se transforma em uma das melhores piadas do filme, principalmente quando interligada com a visão do que é ser homem no Mundo Real. Os personagens, interpretados por esse elenco lotado de estrelas, são de se tirar o chapéu; quando li algumas críticas dizendo que as atuações de Margot Robbie e Ryan Gosling eram dignas de Oscar achei que era exagero. Ainda bem que eu me enganei. 

Agora, é uma história extremamente feminista? Cem por cento. Isso é exagerado em alguns pontos? Pode ser que sim. Estraga a experiência, fazendo gostar menos da obra da grande Greta Gerwig? Pelo contrário, é motivo de aplaudir! Se for parar e analisar toda a história do cinema, a presença feminina é quase ínfima, principalmente no quesito de mérito em direção e roteiro. Parece óbvio, mas falar desse assunto nos tempos atuais é necessário para enaltecer escritoras e diretoras no mercado audiovisual. E, por mais que pareça ser algo fácil de se produzir, os grandes estúdios fazem algo meia boca jurando de pé junto que vão mudar a história da indústria com a sua “diversidade”, mas acabam caindo no balaio do artificial. 

Enquanto isso, Greta fez algo muito longe de ser artificial, trazendo o ingrediente secreto de todas os bons filmes que é a autenticidade (ou os filmes com coração). É um roteiro original com sacadas que mostram seu conhecimento do repertório, uma direção espetacular que se aventura misturando elementos 2D e musical, e uma produção um tanto quanto rosa-chocante. Então se, há alguns anos atrás, alguém me dissesse que eu choraria vendo o filme da Barbie, eu não acreditaria nem um pouco, mas saberia que isso iria mudar minha perspectiva do futuro, porque Greta Gerwig é o futuro; essa mulher vai longe e está no caminho de revolucionar a indústria cinematográfica (sinto um cheirinho de Oscar vindo aí).