A cultura do video game e as retóricas de consumo que permeiam essa pujante indústria geraram uma pluralidade de públicos consumidores inseridos dentro deste contexto contemporâneo. A maturidade que este mercado atingiu nas últimas duas décadas, entre outros aspectos, criou diferentes práticas e usos divergentes para os games e, hoje, além dos jogadores casuais e hardcore players temos um inúmero contingente de indivíduos que consomem jogos de maneiras bastante variadas e específicas.

Só para citar alguns exemplos, temos os espectadores de games que dedicam seu tempo para assistir horas e horas de gameplay de jogos em sites como o YouTube como se fosse um filme de cinema; há também os speed runners que colocam a prova suas habilidades visando terminar um jogo (ou uma fase de um jogo) no menor tempo possível. Uma outra figura que encontramos nesse complexo ecossistema lúdico são os e-sport players, jogadores que participam ativamente e profissionalmente de campeonatos dos mais variados estilos de games, sendo que muitos vivem de premiações que este tipo de prática adota como recompensa.

Não é a intenção deste texto listar todos os tipos de consumidores de games e suas particularidades. Seria uma tarefa hercúlea e que, certamente, terminaria por falhar em algum aspecto de organização dado o tamanho de categorias e subcategorias que existem atualmente. O que pretendemos discutir aqui é porque determinados indivíduos se reúnem em torno de um estilo de game, de um jogo específico ou de uma prática lúdica e formam verdadeiras comunidades que, hoje, extrapolam o contato para sites de redes sociais e tantas outras plataformas digitais. É importante, nesse contexto, fugir da ideia de estereótipo tomando a parte pelo todo em uma relação metonímica (LIPPMAN, 1972, p.158) e enxergar a multiplicidade de comportamentos de jogadores que temos presente na contemporaneidade.

Portanto, vamos refletir – dentro das inúmeras práticas de apropriação do universo dos jogos – alguns pontos elementares para entendermos o que motiva determinados jogadores a fazerem parte de um determinado núcleo lúdico e algumas ideias que ajudam a entender porque estes indivíduos continuam jogando.

Uma autora que nos auxilia nesse percurso é Mary Flanagan (2009, p.5) que aponta que certas pessoas, ao jogarem juntas, formam comunidades e desenvolvem uma identidade de grupo com grande senso de pertencimento; nesse caso, o ato de jogar assume aspectos de uma ferramenta de autoconhecimento e reflexão sobre o eu. Esta mesma autora (2009, p.9) ainda aponta que os games, de certa forma, criam relações sociais e trabalham retirando os jogadores do cotidiano inserindo-os em outros contextos. Com a fala de Flanagan vale lembrar que os consoles de última geração de video games possuem suas próprias redes sociais agregando diferentes tipos de indivíduos, assim como os smartphones, tablets e tantos outros devices que possuem jogos e conexão com a internet em suas interfaces. Socializar através dos games parece ser uma atividade que, cada vez com mais frequência, vai ganhando mais e mais território nas práticas contemporâneas de comunicação e consumo.

Importante frisar que mesmo nos primórdios da indústria do video game, quando jogar online era algo impensável, já existiam grupos de pessoas que se organizavam em espécies de clubes pra organizar campeonatos, escrever fanzines e registrar recordes dos jogos. Ou seja, uma comunidade de players se dá independente de conexão com internet e redes sociais digitais.

Marshall McLuhan, na década de 1960, em seu livro Understanding Media: The Extensions of Man (1964) já postulava que os jogos possuem um papel importante na sociedade e que são meios de participação coletiva bastante importantes.

Por esta linha de raciocínio, entendemos que os games são formas legítimas de mídia, expressão humana e importância cultural, as maneiras que os games refletem as normas e crenças das culturas ao seu redor são essenciais para entender os games em si e os insights que eles adicionam à experiência humana (FLANAGAN, 2009, p.67). A ideia de objeto cultural e artefato de expressão social humana deflagra a inúmera quantidade de apropriações que diferentes indivíduos fazem dos games; seja porque assistem, jogam, analisam, estudam, comentam, ganham dinheiro etc. os envolvidos nestas experiências estão o tempo todo consumindo significado, obtendo pertencimento a um determinado grupo social e buscando entretenimento.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LIPPMANN, Walter. Estereótipos. In STEINBERG, Ch. (org.) Meios de comunicação de massa. São Paulo: Cultrix, 1972.

FLANAGAN, Mary. Critical Play – Radical Game Design. Cambridge: MIT Press, 2009.

McLUHAN, Marshall. Understanding Media: The Extensions of Man. London: Routledge, 2001.

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Vince Vader

Vicente Martin (@vincevader) é professor de criação digital e supervisor do departamento de criação da ESPM. Estuda, desenvolve e é apaixonado por games.

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