Após o mistério sobre os vinte anos de aniversário do OK Computer, no qual mensagens contra posições autoritárias foram espalhadas por grandes cidades no mundo, o Radiohead anunciou o relançamento do álbum de 1997 sob o título “OK NOT OK”, contendo a remasterização (direto das fitas originais) das doze faixas já conhecidas, além de oito B-Sides e três inéditas. Contudo, a notícia significa bem mais do que uma simples comemoração de duas décadas.

4q5KhV5

Screen-Shot-2017-04-26-at-11.20.39-AM

Lançado em 21 de Maio de 1997, o sucessor do The Bends (1995) não apenas redefiniu os padrões da banda (que encontrou o equilíbrio perfeito entre o Brit-Pop e a linguagem do chamado “art rock”) e da música até então, como apresentou uma das obras-primas dos anos 90. O álbum conceitual trabalha temas que abrangem reflexões sobre a sociedade contemporânea, consumo, depressão, a relação moderna com tecnologia e o modo de viver impostos pelo sistema capitalista.

A sua importância musical é evidente, ao passo que mistura influências do rock progressivo à música erudita e eletrônica. Os sintetizadores e a guitarra (distorcida ou não) conversam em perfeita harmonia com os instrumentos clássicos, de modo a criar a ambientação de ficção científica em ‘Subterranean Homesick Alien’, por exemplo. A experimentação instrumental, junto ao conteúdo lírico das letras dão ás canções um caráter não-linear ímpar, com forte influência na música atual, tal característica já pretendida pelo grupo, este que tentou (e conseguiu!) imaginar a música e a sociedade no futuro durante a composição.

Com o emblemático riff, ‘Airbag’ abre o álbum cantando sobre renascimento e salvação, frutos da experiência de quase morte de Thom Yorke em um acidente de carro. Seguida pela ácida ‘Paranoid Android’, com fortes mensagens de degradação da natureza humana, sobre como abandonamos nossa humanidade e as consequências psicológicas disso. Ao passo que ‘Subterranean Homesick Alien’ e ‘Exit Music (For a Film)’ ajudam a evidenciar a experimentação instrumental supracitada, tornando-as imprevisíveis e explorando ao máximo a melancolia particular de ambas. ‘Let Down’ parece um respiro, mas manifesta profundo descontentamento com a impotência perante à sociedade, suas mudanças e influência sobre nós. Tal sentimento deságua em ‘Karma Police’ e a “detenção do anormal”, por este romper padrões e bagunçar a “ordem” das coisas.

‘Fitter Happier’, apesar de possuir melodia breve, é rapidamente lembrada pela sua representatividade e peso dentro do álbum. A voz robótica nos dá ordens sobre padrões a serem seguidos, sendo o único caminho para “uma vida mais feliz e produtiva”. Em sequência, ‘Electioneering’ coloca o eu-lírico na posição de político, este que apenas se importa com o próprio progresso, enquanto a população “fica para trás”. A claustrofobia e a relação moderna com segurança e privacidade são colocadas em pauta na misteriosa ‘Climbing Up The Walls’. O hit ‘No Surprises’ representa um dos maiores sucessos da banda inglesa com instrumentos semelhantes aos de músicas de ninar enquanto Thom Yorke personifica um homem sem esperanças, engolido pelos padrões modernos e que apenas consegue encontrar sossego na morte. ‘Lucky’ (música feita para as crianças que viveram guerra na Bósnia) e ‘The Tourist’ finalizam a saga do homem renascido, que termina o álbum com mensagens de desaceleração da vida moderna.

O relançamento do OK Computer não celebra seus vinte anos, mas nos alerta sobre o perigo da ascensão de governos autoritários e pensamentos conservadores e preconceituosos. O disco continua extremamente atual, mas não era para ser assim: seria uma ótima distopia se não fosse tão próximo à realidade.

Crítico mirim, desenhista amador, escritor júnior e futuro diretor (se tudo der certo).