A primeira aparição do Godzilla se deu em 1954, nos cinemas japoneses, pouco tempo depois dos ataques americanos com bombas nucleares em Hiroshima e Nagasaki, na Segunda Guerra Mundial. Desde então sua figura se tornou uma das mais famosas e conhecidas no universo da cultura pop. Considerada a franquia de maior duração da história do cinema, teve seu último filme lançado em 2016 com a alcunha de Shin Gojira, retomando sua origem no país do Sol nascente, algo que não acontecia há 12 anos.

O termo Godzilla é a ocidentalização americanizada de Gojira, que por sua vez é a união das palavras japonesas gorira e kujira, que significam gorila e baleia, respectivamente, dando alusão à força e tamanho da criatura. Seu porte colossal é resultado de mutações vindas do conflito entre humanidade e natureza, ou melhor, do resultado do conflito entre a própria humanidade, que acaba por impactar a natureza com seus atos.

Godzilla in a scene from the film.

Mas o bicho não é apenas reflexo dos ataques nucleares ao Japão, ele é a eternalização do ocorrido, a garantia de que essa atrocidade nunca será esquecida. Desta forma, o Godzilla tem uma importância muito maior do que a de um personagem icônico do entretenimento. Na época do lançamento de seu primeiro filme, ele foi um forte responsável pela normalização do assunto dos ataques nucleares na sociedade nipônica, ajudando-a a digerir esse trauma.

Com a repercussão do primeiro filme a nível mundial, não demorou muito para que surgisse interesse das grandes produtoras cinematográficas estadunidenses em se apropriar da história da criatura. Isso ocorreu em 1956 com “Godzilla, King of Monsters!”, que não passa de uma re-edição do filme original com a eliminação de algumas cenas e a alteração do idioma e dos diálogos para ambientar a trama em Nova Iorque.

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Aparentemente, essa importação foi apenas uma tentativa de vender um filme potencialmente popularizável para o mercado ocidental, o que o colocaria ainda mais em destaque. Porém, a partir do momento que tiram Gojira do arquipélago japonês e o transferem para a ilha de Manhattan, perde-se seu valor e seu propósito, afinal ele é uma metaforização midiática de um sofrimento que pertence somente ao povo do Japão. Sem falar que é totalmente irônico que os próprios causadores desse sofrimento foram os que mais adaptaram a obra para outro contexto.

Por outro lado, não se pode ignorar que, com sua popularização, Godzilla se tornou um produto e, consequentemente, uma marca. Hoje sua figura está estampada em camisetas, cadernos, brinquedos e até mesmo é tema de um hotel em Tóquio. Assim, foi inevitável que o conceito por trás da criatura se perdesse com o tempo. Mas há de se concordar que, assim como ver um leão na selva é muito melhor que em um zoológico, é muito mais satisfatório ver o querido lagarto mutante gigante japonês em seu habitat natural.

Texto de Lucas Vigliar

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