Foi num ano extremamente atípico que o pop-punk voltou à vida: em meio a uma pandemia global e discussões políticas infindáveis, “Dear Maria, Count Me In” do All Time Low  ganhou disco de platina duplo e Travis Barker está de volta em primeiro lugar nos charts do mundo todo. 

Membros da banda All Time Low fazendo a trend viral de “Dear Maria Count Me In”

Numa realidade em que o apocalipse sobe nos trends toda semana, líderes globais são abertamente genocidas e a juventude se rende continuamente à falsa segurança da nostalgia, faz sentido que uma geração inteira peça socorro para o gênero musical das guitarras trituradas e refrões indignados. Mas, diferentemente de ouvir os mesmos homens brancos héteros repetirem os mesmos versos sobre garotas sem rosto e problemas com o pai, temos um grupo diversificado de artistas, que mantiveram o senso de beligerância e diversão do gênero, mas o estão desenvolvendo para criar algo jovem que também tenha uma qualidade que essas bandas mais antigas evitavam – maturidade emocional.

Os punks de hoje vão à terapia (I’m Gonna Tell My Therapist On You por Pinkshift) e cantam auto-reflexivamente sobre relacionamentos e problemas ainda maiores do que aqueles que enfrentamos dentro de casa. Willow Smith é o reflexo vivo disso. 

Quando criança, WILLOW observou sua mãe, Jada Pinkett-Smith, suportar o racismo e o sexismo enquanto estava em turnê com a banda de nü-metal, Wicked Wisdom. Sua lição principal? Mulheres negras não tinham permissão para fazer rock, punk, muito menos metal. 

Enquanto isso, o novo pop-punk é liderado por mulheres. Willow Smith sendo, sem dúvida alguma, o maior nome da ressurreição do gênero. Agora, aos 20 anos, a jovem artista mostra que está no controle: em seu quarto álbum, lately I feel EVERYTHING, a cantora se despede da adolescência enquanto encara suas lutas internas e fala de raça, romance, saúde mental e a trajetória de auto-aceitação. Encontrando, assim, sua própria sonoridade e ganhando o espaço na indústria e nos holofotes que foi negado à sua mãe por uma época asfixiada pelo preconceito. 

O single “t r a n s p a r e n t s o u l” abre o álbum e, mesmo que você não seja um ávido usuário do TikTok, provavelmente já ouviu o hit, uma parceria com Travis Barker. Travis, aliás, já é quase um nome obrigatório para toda e qualquer produção do novo pop-punk. 

O baterista do Blink-182 tem sido o verdadeiro mentor dos pop punks de 2021, tendo aparecido em peso nos trabalhos de artistas como Machine Gun Kelly e YUNGBLUD. Os três, juntos ou não, também têm divulgado seu som no TikTok, app que, como a MTV, o MySpace e o YouTube antes dele, está revolucionando completamente a indústria da música. Com canções projetadas para serem as mais cativantes possíveis e uma comunidade diversa e inclusiva, o pop punk naturalmente encontrou um lar na plataforma.

YUNGBLUD, Machine Gun Kelly e Travis Barker

“Todo mundo tem uma capacidade de atenção muito curta, mas ouvir um refrão pop punk realmente bom pode trazer uma criança para o gênero inteiro”, diz o músico e vlogger britânico NOAHFINNCE. “Em um mundo onde ninguém tem paciência, o pop punk é exatamente o que as crianças precisam.”

Lately i feel EVERYTHING de Willow usa dessa impaciência e traduz uma geração com o rock alternativo terapêutico como plataforma de lançamento, levantando diferentes componentes e inspirações, dentre eles o punk angustiado de Bikini Kill, uma face mais suave do shoegaze e, inevitavelmente, o pop-punk que cresceu ouvindo, colocando tudo isso em equilíbrio. 

Photoshoot de Avril Lavigne e WILLOW para “GROW” música que colaboraram juntas de Travis para lately i feel EVERYTHING

E ela não é a única: a Geração Z, como um todo, não tem medo de misturar as coisas. Olivia Rodrigo é outra jovem artista que reflete isso. Em Sour, seu álbum de estreia, ela referencia na mesma medida Paramore e Taylor Swift. A banda vencedora do Eurovision, Måneskin, também é adepta dessa mistura. Em músicas como Coraline e Vent’Anni, principalmente, eles não só trazem um mix de gêneros musicais como tratam de política, sexualidade e saúde mental. A ideia de tribos limitadas, estruturas regradas de gênero, orientação sexual e mesmo da música, já não faz sentido aos olhos da Gen-Z.

Måneskin

O som desregrado sempre foi parte do punk, independentemente da época ou vertente. Ainda assim, nunca antes o gênero teve uma identidade tão múltipla e inclusiva. A nova versão desse estilo musical trouxe uma perspectiva mais madura e engajada que não aceita pôr suas dores e as do mundo numa redoma de vidro irrevogável ou colore distúrbios mentais como uma parte melancólica da própria personalidade. O punk voltou e, dessa vez, ninguém será deixado para trás.

Construindo minha odisseia com palavras que encontro por aí