Sim. Pode-se dizer que os desafios da quarentena pesam. Tanto eu quanto você já nos desesperamos por conta da rotina monótona e sem ação que passou a cercar nosso cotidiano. Isolados, longe dos amigos, dos abraços, dos beijos. Parece que um pedaço de nós foi arrancado repentinamente, sem nem perguntar se podia. Mas em meio de tanto conflito interno, a paz e a tranquilidade passaram a reinar nas ruas da cidade.

O diretor e roteirista Naz Riahi produziu um curta-metragem em formato documental, “Sincerely, Erik“, da vida de Erik Duron, o dono de uma livraria afetada pela pandemia do coronavírus. O curta evidencia o dia de homem, mostrando o peso emocional do distanciamento que habita sua mente, e a melancólica beleza da cidade de Nova York em meio ao vazio das ruas. Veja:

A partir da nova interação com o mundo, além de sentirmos falta das conversas banais com nossos amigos, sentimos a carência de sermos escutados. Sentimos a falta de apenas falar. No curta, Erik busca sanar esses dois problemas. Através de cartas para algumas mulheres, ele tenta tirar um pouco do peso que esta entalado em sua garganta e, com o intuito de só falar, conta curiosidades sobre alguns livros e coloca para fora alguns assuntos que eram de seu cotidiano na venda das obras, que passaram a ser momentos raríssimos nessa nova fase. Ele precisava daquilo. E como todo humano, ele também precisava de uma conversa com alguma pessoa próxima, apenas para jogar conversas ao vento e contar o que a vida lhe trazia. Abafar um pouco o vazio de seus dias.

O mini documentário conseguiu uma boa aproximação com o telespectador, fazendo com que nós nos identifiquemos com aspectos da rotina de Erik, principalmente dentro de sua casa. Cenas do homem se levantando, fazendo o café, tendo momentos de ócio junto ao celular, fazendo a comida e vestindo os novos trajes contra o vírus, como a máscara e a luva, causam essa interação com quem vê, fazendo uma inserção com sentimento do público. Junto as imagens, a emoção que Erik passa com as palavras nas conversas, também alimentam essa identificação, mostrando que mesmo distantes, estamos no mesmo barco de solidão.

Todo esse vazio instaurado pelo mundo faz com que a cidade revele um outro lado: de paz e tranquilidade. Coisa que as grandes metrópoles não deixam acontecer. A cidade de Nova York, como mostra no vídeo, muda totalmente de cara e escancara um cenário desértico nas cidades mais movimentadas e populosa dos Estados Unidos. Com a quase ausência humanitária, a cidade aflora todo o seu lado bonito e faz com que fiquemos mais atento ao nosso entorno. As flores ganham mais vidas, o vento mais impacto, o silêncio vira música e a cidade ganha mais cor. Cenas de metrôs vazios, calçadas sem trânsito, avenidas com pouco carros, conseguem transparecer a paz e tranquilidade que a cidade passa a transmitir. Momentos raros como esse merecem ser olhados antes de merecer o esquecimento.

E como esquecer do aspecto que dá o tom para a narrativa: o som. O desenrolar da história fica se alternando entre uma música calma, a qual transmite bem o conceito da peça, e os sons ambientes, que mostram o barulho natural das coisas, fazendo do silêncio um aspecto fundamental para a audição. O som de poucos carros passando, o “bip” do metrô, as plantas se batendo, os passos do homem, as chaves se mexendo, a torneira aberta… faz com que, além de percebemos os ruídos naturais das coisas, nos aproximamos mais da narrativa com os sons banais do dia a dia que nosso cérebro capta ao ouvir nitidamente no curta.

“Times Square” vazia

O curta metragem passa tanto a crise do humano, quanto a beleza da cidade, mostrando dois extremos no mesmo vídeo. Foi visto que, de certa forma, a solidão e a beleza andam de mãos dadas. É apenas uma questão de ótica.