Música nem sempre é pra ser comercial. Nem sempre é pra agradar todo mundo. E não é por ser diferente que a música é ruim. Esse é um preceito que muitos críticos de música e jurados de reality shows musicais não conhecem muito bem, e isso não vem de hoje.
Na década de 60 começou a ser realizado, no Brasil, o Festival Internacional da Canção, que era exibido na Globo. Em sua quarta edição, em 1969, Jards Macalé apresentou sua incrível música Gotham City (composta em parceria com Capinam), mas a rejeição do público e dos jurados foi instantânea, e o músico foi completamente vaiado por todos os presentes no Maracanãzinho.
A letra extremamente enigmática continha uma crítica muito bem disfarçada à situação que o Brasil estava passando naquele momento (o endurecimento da ditadura com o AI-5) e o que parecia é que ninguém conseguira compreender e não deu chance ao cantor.
Jards não foi o único que passou por isso, mas nomes como Arrigo Barnabé, Jorge Mautner, Sérgio Sampaio, Luiz Melodia, Itamar Assumpção e Tom Zé também faziam parte dos que são chamados de “Malditos da MPB”. Todos com seu experimentalismo supostamente excessivo e letras cheias de críticas muito bem colocadas em porções de metáforas e ironias.
Músicos e movimentos musicais rejeitados pelo público e pela crítica se repetem sempre. Mas, há este movimento do início desta década, o vaporwave, que se assemelha muito, para mim, com os tais malditos daqui.
O vaporwave toma como inspiração elementos culturais como cyberpunk, glitch art e webdesign dos anos 90, e, na música, ele surge a partir do seapunk e do chillwave – assim como os malditos surgiram do Tropicalismo. No novato, igualmente, há muita experimentação e críticas fortes em seu conteúdo.
A diferença entre os dois é simples, e está no tempo e espaço de onde vieram: o primeiro surgiu num Brasil duramente ditador; o segundo, num ambiente digital (internacional) pós-crise econômica.
Um álbum do vaporwave que facilita esta conexão é o “NYC, Hell 3:00 AM”, lançado no ano passado por James Ferraro, um dos precursores do movimento. Em sua primeira faixa já é visível sua crítica à vida da grande metrópole enquanto uma voz robotizada feminina repete a palavra “dinheiro” diversas vezes.
O resto, só conferindo pra saber. O álbum está disponível em serviços de streaming online gratuitos como Spotify, Rdio e Deezer.
Rafa Gonçalves
Ama trocadilhos e sonha em discobrir o mundo.
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