Na série The Midnight Gospel, criada por Duncan Trussell e Pendleton Ward, o protagonista, Clancy, escapa de seus problemas da vida real introduzindo-se em mundos surrealistas para gravar seu espaçocast. Suas ecléticas conversas incluem uma diversa coletânea de convidados, desde simples humanos até a morte em si.

Ao tratar de assuntos como filosofia, religião, existencialismo, saúde e a própria vida, a série é capaz de desmistificar a ideia equivocada de que animações estão sempre ligadas a temas superficiais. O estilo onírico de Midnight Gospel traz uma estética colorida que estimula nossa imaginação e encanta nossas mentes ao arremessar inúmeras situações caóticas, porém belas, na cara do espectador. Muitas vezes me via perdido na graciosidade da animação e, pouco depois, percebia que não estava prestando atenção no que estava sendo dito pelos personagens.

No sétimo episódio, Mente superlotada, conhecemos mais a respeito dos próprios dilemas mentais do protagonista, explorando a fundo sua ansiedade. Após postergar a manutenção do simulador que o coloca nos mundos onde grava suas conversas, Clancy se encontra tendo que lidar com problemas da vida real, o que, para ele, é extremamente sufocante. Aprendemos, nesse episódio, que o protagonista possui uma relação complicada com a irmã e que ele foi responsável pelo afastamento entre os dois. 

Quando finalmente conserta o simulador, o spacecaster viaja para um de seus mundos e conversa com David, um instrutor de meditação. Repleto de raiva por ter que lidar com seus próprios problemas, Clancy fica sozinho com seus pensamentos e nota a presença de um macaco telefonista, que pode ser uma representação de sua mente agitada.

Ele tenta controlar o macaco, mas é esse quem acalma Clancy e mostra-lhe uma paisagem repleta de serenidade. Em vez de desejar estar em outro lugar, o protagonista aceita onde está e, consequentemente, sua situação melhora. Nessa situação, interpreto que o lugar em questão não é físico, mas sim um estado mental e emocional.

Em outras palavras, citando a explicação de David, “ficar envolvido na sua história é como morar em um apartamento pequeno com espaço suficiente para você e seu colchão. Quando ganha espaço entre você e seus pensamentos, é como se mudar para uma casa muito maior. Assim, há espaço para você mesmo e espaço para convidar outras pessoas”.

David deixa claro que muitos ensinam a tratar a mente como um adolescente rebelde que deve ser calado e que isso é um equívoco. Concordo, uma vez que calar um adolescente rebelde, sem dar espaço para entendê-lo, resulta em um adulto angustiado. 

Logo em seguida, Clancy elabora uma instigante analogia acerca da mente do ser humano e a ansiedade que a atormenta: 

“Devemos aceitar que existe um enxame infinito de pensamentos em nossa mente, mas que não estamos necessariamente tão ligados a eles como pensamos”.

A ansiedade é um estado emocional do ser humano comumente relacionado ao medo, angústia e insegurança. Isso porque ela é a agente responsável por dar atenção aos pensamentos enganosos que fluem dentro de nós e por intensificá-los.

Por meio dos ensinamentos do episódio, fui capaz de entender minha própria ansiedade por outra perspectiva. Se dermos espaço para o enxame de pensamentos fluir dentro de nós, sem dar atenção aos respingos de ansiedade, é possível encarar a realidade de maneira mais clara. 

The Midnight Gospel é uma série repleta de conversas e ensinamentos, no que diz respeito à vida, capazes de causar sérias reflexões sobre a forma como vemos o mundo. Note que esse texto diz respeito a apenas um dos oito extraordinários episódios aptos para provocar ponderações em relação ao nosso universo.

Me despeço de você, caro leitor, com apenas uma sugestão: dê espaço para você e seu colchão.