“O maior conforto da vida é olhar para trás e ver que tem gente que está pior, atrás de você na fila.”

“Quem você ama e quem ama você nunca são, nem jamais serão, a mesma pessoa.”

“Só depois de perder tudo que você fica realmente livre para fazer qualquer coisa.”

Ler Chuck Palahniuk é ter que confrontar algumas verdades desconfortáveis sobre nossa vida em sociedade, nossos sonhos e nossa disposição para atingi-los. Palahniuk desfia todas as contradições e absurdos que as instituições americanas (e por que não dizer de todos nós?) carregam em seu interior.

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Do absurdos da cultura midiática, que transformam um simples sobrevivente de um culto suicida em um messias da fé e do consumismo à crítica do modelo de vivência social masculino, que distancia os homens de uma experiência mais profunda com outros homens, propondo então um clube em que estes possam fazer o que há de mais masculino na natureza humana: brigar.

Seu humor é ácido. A família nuclear tradicional não passa, para ele, de um amontoado de mágoas mal-resolvidas protagonizadas por zumbis dependentes cada um de seu psicoativo prescrito, Rivotril pra mamãe, Xanax pro filhinho e Prozac pra filhinha. Papai? Talvez algumas drogas que se vendem no boteco.

Nascido em Pasco, no estado americano de Washington, a história de Palahniuk e seus 3 irmãos já começou marcada pelos problemas de quem tenta ir contra o sistema: viveu em um trailer durante a infância e foi criado por seus avós maternos após o divórcio dos pais.

A violência, tema recorrente em seus livros, parece quase um reflexo catártico de sua própria história de vida: seu avô paterno assassinou a mulher e quase todos os filhos antes de se suicidar, o pai do autor sendo o único a escapar; pai este que foi assassinado junto com sua namorada em 1999, pelo ex-marido dela.

Quanto se sabe destes detalhes, olhar para as obras de Palahniuk e pensar que a arte imita a vida parece até uma conveniente brincadeira de humor negro.

Após se formar em Jornalismo, se mudou para Portland onde trabalhou por um tempo em um jornal local até arranjar emprego como mecânico na fábrica de caminhões Freightliner.

Além desse trabalho “blue collar” como é chamado nos EUA, o escritor também trabalhava como voluntário em um abrigo para moradores de rua e motorista em uma instituição que cuida de doentes terminais. Largou este segundo trabalho quanto um paciente muito querido veio a falecer.

Os locais por onde transitava, sem glamour e onde quase ninguém precisava de máscaras para que os outros virassem o rosto, o fascinavam. Na verdade, as histórias de vida que ouvia ali o fascinavam.

Começou a escrever não-ficção em meados dos 30 anos, após frequentar alguns workshops de escrita literária ministrados por Tom Spanbauer. O objetivo inicial era apenas fazer amigos, mas claro que o inconformado Palahniuk aproveitou a experiência de estar ali junto com sua história pessoa e passou a escrever romances.

O primeiro livro que tentou publicar foi Invisible Monsters, que foi rejeitado por todas as editoras devido a seu conteúdo pesado e considerado impróprio (psicopatas com múltiplas personalidades, romances transgênero e incendiários sádicos).

Seu primeiro livro aceito para publicação em 1996 foi também seu maior sucesso: Clube da Luta (sim, é aquele filme com o Brad Pitt gatão e o Edward Norton perdedor, mas não precisamos falar dele, né?)

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A história é contada por um narrador sem nome, que trabalha com recall de produtos para uma montadora desconhecida busca presenciar a desgraça alheia, seja em seus relatórios sarcásticos ou em encontros e pessoas com câncer para lidar com sua constante insônia.

Sua vida muda quando conhece Marla, outra turista de grupos de ajuda com a qual arranja briga, e Tyler Durden, um maluco que conhece em uma praia de nudismo e que é obrigado a morar junto após sua casa explodir em chamas.

A condição para que Tyler aceite o narrador é simples e um tanto estranha: “Me bata o mais forte que puder”. Nascia aí a premissa do tal Clube, que passou a agregar cada vez mais homens cansados da rotina opressiva e repetitiva na qual seus instintos mais básicos eram suprimidos em prol da boa convivência.

O Clube angaria tantos e fanáticos membros que evolui para um culto, o Projeto Mayhem, cujos objetivos anti-consumistas parecem se mesclar com a personalidade de Tyler.

Em 1996, o escritor lança Survivor, em que Tender Branson, sobrevivente de um culto suicida, procura fugir da própria morte ao mesmo tempo que acaba se tornando uma figura religiosa por ter sobrevivido à “salvação”.

Sempre buscando inovar com relação à forma de suas narrativas, o livro possui capítulos e páginas de trás para frente, começando no capítulo 47 em que Branson sequestra um avião para que, ao morrer, leve o maior número de pessoas consigo.

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Outro romance de destaque é Choke, de 2001, sobre dois amigos que se conhecem em um grupo de suporte para viciados em sexo, um por se masturbar em excesso e o outro por procurar apenas relacionamentos superficiais e breves com mulheres que não se da nem ao trabalho de conhecer. O livro foi adaptado para o cinema em 2008 mas não chegou a obter muito sucesso.

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Palahniuk ficou bastante conhecido durante a década de 2000 por suas leituras em público do conto Guts, Entranhas em português. Durante suas viagens de lançamento e sessões de lançamento de seu livro Diary, o autor pedia para sua plateia prender a respiração. “Este conto deve durar o mesmo que o fôlego de vocês”.

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A história, que envolve atos sexuais bem pouco convencionais, com um narrador pré-adolescente que se vê em uma situação constrangedora de vida ou morte, apresentada de forma extremamente gráfica que faz jus ao título Entranhas, resultava não raro em pessoas desmaiando na plateia.

Fosse pela falta de ar, fosse pelo conteúdo gráfico e tenso apresentado na história, não se sabe o motivo dos desmaios. Mas com certeza fizeram a fama do conto e do livro em que está inserido, Haunted.

Em Pygmy, de 2009, o narrador é um agente secreto de uma ditadura sem nome com requintes de Alemanha nazista ou Coreia do Norte, que tem como missão se infiltrar na América e engravidar o maior número de americanas possível, para que em poucas gerações o país seja dominado por descendentes do país estrangeiro.

Todo o absurdo da hierarquia de popularidade dos High Schools americanos bem como do funcionamento familiar dentro dos lares é explorado com um texto truncado, como se fosse um relatório militar escrito por um operativo cujo domínio da língua inglesa não é dos melhores.

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Recentemente, o autor lançou Beautiful You, uma espécie de paródia de romances voltados ao público feminino como O Diabo Veste Prada e 50 Tons de Cinza. O título inicial do romance era uma mistura de todos esses nomes com livros de Nicholas Sparks mas obviamente foi rejeitado.

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O autor também tem trabalhado em uma continuação de Clube da Luta, dessa vez em formato quadrinhos e previsto para ser publicado em 2015.

Se muitos o consideram um autor que só procura chocar seus leitores, Palahniuk rebate: “Não posso controlar a recepção por parte dos leitores. Muitos parecem não captar o lado emocional das histórias. Sempre tento terminar os livros com um final feliz”.

Minha barba. Minha vida.