Sinapse por Pedro Hutsch Balboni, 15/12/2009 às 17h00

Comunicar não é algo simples. Seja por meio de expressões corporais, de falas, palavras, olhares.. sempre existe alguma dificuldade. Essa dificuldade muitas vezes nos leva a algum lugar comum, a um beco sem saída onde somos obrigados a nos comportar como conhecemos, ou seja, como os outros todos se comportam.

O mais comum acontece em nossa infância, e lembro que tomei um susto quando percebi. “Fulano, conte o que você fez no seu final de semana”, disse a professora, e em seguida o Fulano começa a longa e detalhada descrição “Fui em tal lugar, aí fui comer, aí fui jogar bola, aí dormi, aí nadei, aí aí aí…” – notaram? O repetido uso de “aí’s” é recorrente em crianças, pois elas ainda não desenvolveram direito seu repertório, e são obrigadas a usar o que sabem. (Infelizmente, isso também acontece com pessoas com baixo grau de escolaridade, o que é recorrente em nosso país).

Essa discussão poderia ser levada para inúmeros lugares, para lugares mais altos do que eu teria condições de sustentar. Poderíamos contestar os lugares comuns na publicidade, poderíamos nos indagar se os lugares comuns não são, na verdade, necessários para a publicidade, poderíamos ir para a questão de que não existe nada novo, apenas variações do velho – nada se cria, tudo se copia – mas resolvi trazer um foco bem mais estreito para a pauta de hoje.

 

 

Quero falar da expressão “cada vez mais”. Não sei se é porque trabalho com tendências, mas cada vez mais vejo a expressão “cada vez mais” ser usada por aí. Há cada vez mais carros no mundo, cada vez mais doenças, cada vez mais tecnologia, cada vez menos tempo (o que é uma variação, mas quer dizer basicamente a mesma coisa), cada vez mais as pessoas falam “cada vez mais”. E isso se aplica a uma série de temas e abordagens. Cada vez mais é uma expressão que fala sobre uma tendência, uma constatação da realidade. E, se cada vez mais as pessoas estão falando “cada vez mais”, de duas, uma: ou muitas pessoas estão pensando muito sobre uma série de questões e expressando cada vez mais suas opiniões, ou há uma certa limitação linguística, não sei se no repertório individual, ou se a própria língua ainda não se adaptou para essa nossa nova realidade de transformações constantes.

Na verdade, peço licença para me contradizer. Acredito que esses dois fatores citados acima coexistem. Acho sim que as pessoas estão expressando mais o que pensam sobre o mundo – o que não significa que essas reflexões são aprofundadas, e sim que existe maior possibilidade de falar e ser ouvido por causa dos meios de comunicação atuais. E acho também que há algum tipo de carência da língua para tratar do nosso cotidiano, e claro, uma carência de cada pessoa que não saberia dizer “cada vez mais” de outra forma. Aqui no Newronio mesmo, que me perdoem os outros redatores (sim, os outros, pois eu já me perdoei), já vi DEMAIS todos usando “cada vez mais” em seus textos. E sabe o que me tranqulizou? Descobrir que essa é uma dificuldade recorrente. Estou acabando de ler “Cultura da Convergência”, de Henry Jenkins, mas já descobri que no livro também há diversos “cada vez mais” – o que mostra que ou o autor, ou o tradutor, ou os dois, sofrem do mesmo “problema” que muitos autores de blogs.

Só para constatar de forma empírica, fiz uma busca no incontestável Google Insights pelo termo “cada vez mais”, cujo resultado você confere abaixo:

Bom, na verdade, esse gráfico não comprova nada, o crescimento no número de buscas por “cada vez mais” deve ser apenas resultado do crescimento orgânico de usuários da internet. Mas achei curioso haver de maneira tão marcada uma baixa nas buscas no começo, no meio e no fim do ano.. férias talvez? Bom, pra pesquisar temas tão esquisitos assim, talvez eu é que esteja precisando parar um pouco 😛

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