Para muita gente, a fotografia serve apenas a ideais estéticos: uma boa apresentação formal de um objeto belo, ou, por vezes, o enquadramento e a luz servem de suporte para se chegar à beleza de algo banal, por vezes até mesmo algo não-belo.

Ou seja: por meio de artifícios fotográficos se retrata o belo, independente de qual seja o objeto fotografado.

Para Diane Arbus, isso é um absurdo. “Eu acredito que fotografo coisas que ninguém veria caso eu não as mostrasse” disse a fotógrafa americana acerta de seus temas. E estava certa.

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Nascida Diane Nemerov em Nova Iorque em 1923, desde muito cedo apresentou aptidão e sensibilidade para as artes, passava o tempo inteiro desenhando.

Com apenas 13 anos conheceu Allan Arbus, com quem se casou 5 anos depois e com quem aprendeu a arte da fotografia. Juntos, trabalharam para diversas revistas de moda como Vogue e Harper’s Bazaar.

Curioso é que nenhum dos dois sentia qualquer simpatia pelo mundo da moda.

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É possível notar já nesses primeiros trabalhos alguns traços marcantes da artista: a preferência pelo retrato, com o corpo humano sempre em evidência, e também pelo esforço em se desviar da simetria padrão da fotografia.

Em 1956 a parceria do casal veio ao fim: enojada com o conteúdo de seu trabalho, agravado pela depressão, Diane resolve buscar seus próprios temas. Tem-se início uma das carreiras mais interessantes da fotografia.

Arbus buscava pessoas que encontrava por Nova Iorque que geralmente não eram percebidas pelas outras pessoas, ou mesmo eram, mas prontamente esquecidas ou evitadas. Eram pessoas da classe trabalhadora, portadoras de alguma deficiência, moradores de rua, transsexuais, travestis e integrantes de circos de bizarrice.

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A fotógrafa procurava, apresentar temas que punham em cheque os padrões de beleza da época; seu maior objetivo era subverter essa categoria tão debatida e que muitas vezes trouxe dor e sofrimento para os retratados.

Diferentemente de muitos outros fotógrafos, Arbus não procurava enaltecer alguma característica de seus modelos que se encaixasse nos padrões, todos eram apresentados da maneira mais direta possível. Era comum a fotógrafa acompanhar seus retratados ao longo do dia, pelas ruas, trabalho e até casa, sempre procurando o momento em que deixassem sua persona pública de lado e se tornassem quem realmente eram.

A maior qualidade de seu trabalho com os chamados “freaks” vem justamente desse método de trabalho: despidos das máscaras que usam para se defender no espaço público, as pessoas podem enfim revelar sua beleza real quando protegidas no espaço privado.

A fotógrafa podia passar meses e até anos ao lado de seus modelos, construindo uma relação que ultrapassa a simples dinâmica modelo-fotógrafo. É possível notar que grande parte de seus fotografados olha diretamente para a câmera, atestando assim a existência da fotógrafa. Não estamos olhando para um retrato de alguém; olhamos para o retrato que Diane Arbus fez de alguém.

Sempre utilizando o médio-formato quadrado, a artista procurava sempre retirar de suas fotografias as divisões clássicas da fotografia, como a composição em 3 partes ou a oposição entre esquerda-direita e cima-baixo.

Essa prática dá um ar de estranheza em suas fotos mesmo quando o tema fotografado é dos mais banais, como crianças brincando ou uma típica família americana de classe proletária.

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A fotógrafa teve grande reconhecimento de seu trabalho já desde a década de 50, ganhou também por duas vezes a Bolsa Guggenheim, financiamento institucional para desenvolver seus trabalhos artísticos, em 1963 e 1966.

Seu casamento chegou oficialmente ao fim em 1969, mesmo que a relação entre Diane e Allan já estivesse deteriorada havia anos.

A crescente indignação da fotógrafa para com o mundo, bem como ataques cada vez mais frequentes e fortes de depressão, a levaram a tirar a própria vida, ingerindo barbitúricos e cortando os próprios pulsos na banheira de seu apartamento, em 1971.

Uma vida dedicada a apresentar ao mundo aqueles que foram por ele marginalizados para então ser vítima de uma doença tão comum e, no entanto, tão estigmatizada e negligenciada.

Não espanta que até hoje suas fotografias causem esse misto de estranheza e admiração, como se fossem algo a ser digerido antes de plenamente apreciado ao mesmo tempo que é difícil olhá-las por muito tempo mas não conseguimos tirar os olhos.

Minha barba. Minha vida.