Há uns meses, escrevi o texto que considero o melhor que já fiz. Ele falava sobre o álbum “Golden Hour”, de Kacey Musgraves, cantora country já nomeada ao Grammy. Em linhas gerais, naquele texto, eu falei sobre como a cantora, na época recém-casada, conseguiu criar uma obra inovadora e maravilhosa ao colocar em palavras sentimentos que eu não acreditava que fossem possíveis de descrever, e como ela abordou de maneira tão linda a temática do amor.

Do mesmo jeito que aquele texto era muito pessoal, esse texto também vai ser bem vulnerável. Lá, contei para vocês que aquele álbum estava me ajudando a passar por um momento específico da minha vida e que ele me ofereceu muita companhia. Agora, venho aqui contar um pouco sobre seu último álbum: “Star-crossed”, lançado em setembro do ano passado. Atualmente, essa obra tem me oferecido a mesma companhia durante um momento delicado pelo qual eu tenho passado e volto com o mesmo objetivo de oferecer as canções de Kacey como conforto para quem esteja passando por isso também.

Em poucas palavras, “star-crossed”, nome da obra lançada na metade do ano passado, significa “ser f*dida pelo amor ou pela sorte”. Kacey não poderia ter escolhido um título melhor para a obra que contaria sobre um novo momento pelo qual ela estaria passando em sua vida: o divórcio. Pensando nisso, nos deparamos com um álbum em que a mulher romântica e apaixonada que vimos em 2018 foi completamente substituída por uma outra triste, saudosa e muito madura.

Algo inegável que continua verdade, lançamento após lançamento dela, é que Kacey consegue se expressar muito bem através de suas letras. Pessoalmente, considero sensacionais as músicas que abordam muitos sentimentos e situações específicas em poucas palavras. É uma habilidade complexa que a cantora consegue fazer com maestria em qualquer canção que lança. Novamente, a texana entrega mais 15 músicas completamente universais, que prometem gritaria e choradeira até para quem não está passando por isso e permitem que as pessoas se emocionem com os pequenos detalhes que ela expõe em cada uma de suas composições.

Kacey abre o álbum com a música “star-crossed”, uma tentativa brilhante de resumir a história que a cantora estará contando no decorrer da obra. “Let me set the scene” é um começo perfeito para o que ela ilustra nos próximos 2 minutos e 26 segundos de som: a cantora narra como se fosse uma cena de um filme – ou livro – que conta a história de um casal que acorda desse sonho maravilhoso e de um relacionamento perfeito para a realidade de assinar os papéis do divórcio. Trazendo um questionamento do que pode ter acontecido para eles terem se tornado isso, Musgraves repete o título do álbum em meio a um instrumental potente e intenso, representando o peso da história que está contando.

De cara, a música que mais gostei do álbum foi “justified”. Apesar de ser um single, o que pode tornar a canção um pouco saturada após um tempo, é impossível se cansar do refrão dançante que a artista criou para contar sobre as diferentes sensações após um término. Ao meu ver, essa música traz uma sensação reconfortante de que está tudo bem ter os seus altos e baixos após passar por isso, e que se parar para pensar, depois de tudo, você tem muitos motivos para se sentir assim.

Depois de terminar um relacionamento, existe uma pressão social de que você precisa superar logo e ficar bem, mas todos sabemos que não é assim que acontece. Na canção ela diz “moving on was feeling strong, but healing doesn’t happen in a straight line”, o que resume muito bem esse processo. Em alguns momentos estamos felizes e bem acompanhados, mas em outros é impossível não se sensibilizar com as memórias e as perdas do fim de uma relação com alguém que você ama. Aos poucos, essa montanha-russa vai se suavizando, mas essa música nos conforta ao dizer que está tudo bem sentir essa mistura.

Atualmente, a canção que mais me toca é “camera roll”. É simplesmente impossível escutar essa música sem derramar algumas lágrimas. Existe sempre aquele tabu após o final de um relacionamento: as fotos. Não se sabe o que fazer: apaga? Deixa? “E se a gente voltar?”, “Ah, não custa nada deixar…”, “Como que eu supero assim?”. Todos esses questionamentos são abordados por Kacey em uma música que conta, em uma melodia calma e mais triste, sobre a dificuldade de abrir seu rolo de câmera após terminar com a pessoa que ama.

Relembrar os momentos bons do relacionamento traz um sentimento positivo de nostalgia, mas que pode acabar doendo quando se tem consciência de que a dinâmica não estava mais assim e que não vai mais ser assim. “I don’t wanna see them, but I can’t delete them. It just doesn’t feel right yet”, uma frase que resume o que muitos sentem, já que é muito difícil desapegar de uma pessoa que te fez tão bem e que, pelas fotos, não traz a dor e os motivos pelos quais vocês se separaram.

O que mata é o final da música. A cantora agradece o ex-amado pelas memórias, falando que esses são momentos que nunca serão apagados, dando o exemplo de uma foto em que toda a paixão estava presente, antes dos sentimentos se esfriarem, ressaltando o conforto (e perigo) de olhar as fotografias. Considero “camera roll” uma obra prima, já que fala sobre um momento pelo qual todos passam, mas que não se vê representado em outras canções por parecer “superficial” e que Kacey conseguiu definir de um jeito lindo e emocionante.


Outra canção que acaba com o psicológico é “if this was a movie..”. Musgraves fala sobre um cenário perfeito pós-término, em que todos os conflitos do relacionamento se resolvem e tudo volta ao normal, mas isso só aconteceria num filme e na realidade não é bem assim. É normal criar expectativas para um retorno, isso faz parte de quase todos os finais. Ela conta sobre cair na real de que, às vezes, só amor não é suficiente para a relação, falando que caso fosse um filme, eles perceberiam que foi tudo uma idiotice e voltariam. Infelizmente, não vivemos em um filme.

“Star-crossed” é uma companhia perfeita para quem está passando pelo mesmo que a cantora. Quem tem a sorte de não estar sentindo isso se depara com uma obra com músicas muito boas e muito bem escritas. Além dessas mencionadas, existem mais 11 músicas te aguardando de braços abertos e oferecendo conforto ao mostrar que é normal sentir tudo o que você está sentindo.

Outros temas apresentados ao longo da obra são a vontade de voltar ao passado, quando as coisas eram simples, sentir como se precisasse ser uma companheira melhor no relacionamento, otimismo de que as coisas melhoram, e muitos outros assuntos. Apesar do baque com as temáticas sérias, lidar com a dor e se permitir sentir é importante no presente e no futuro. Kacey me mostrou isso com um bom pop-country animado e bem sentimental, espero que ela consiga te mostrar também, com seu sotaque e voz maravilhosos.