Arte & Design

A cidade é a galeria: Arte que provoca e questiona

By Colunistas Newronio

September 22, 2014

Em 2006, o artista paulista Eduardo Srur colocou no rio Pinheiros, no centro de São Paulo, 100 caiaques ocupados por 150 manequins de plástico, dando origem a intervenção “Caiaques”, reconstituindo uma cena comum na capital paulista até a década de 1940: habitantes em seu lazer desfrutando das margens limpas e claras do rio. O misto de estranhamento e fascínio provocado pela obra trouxe consigo reflexões sobre as águas poluídas do Pinheiros. “É um rio que morreu por falta de cuidado. Com a intervenção, todos foram obrigados a ver o que não queriam”, lembra o artista para quem a realidade cotidiana adormecida na mente do público pode se alterar frente a esse tipo de impacto visual. Essa relação entre homem e ambiente urbano tem direcionado fortemente a obra de Srur, chamando a atenção da comunidade nacional e internacional para o seu trabalho poético e político.

Dois anos depois, em 2008, vinte garrafas PET gigantes e iluminadas foram instaladas às margens do mesmo rio. As garrafas foram distribuídas ao longo de 1,5 km entre as pontes do Limão e da Casa Verde; cada peça media cerca de 10 metros de comprimento por 3 metros de diâmetro. Mais uma vez Eduardo Srur nos fez lembrar da precária condição ambiental em que a cidade mergulha cada vez mais, ou seja, a instalação pretendia abordar a questão da degradação ambiental em um dos principais marcos da poluição urbana em São Paulo.

Na semana passada (19 de setembro, Dia Mundial da Limpeza da Água), Srur inaugurou sua nova criação batizada de “As Margens do Rio Pinheiros”. A Ponte Cidade Universitária recebeu o manequim realista de um homem vestido apenas com uma regata e cueca brancas, em um trampolim, parece se preparar para pular no rio. Outras pontes da Marginal Pinheiros receberam intervenções parecidas: também em trampolins, novos personagens representando a população paulistana foram colocados nas pontes Cidade Jardim, Eusébio Matoso e Morumbi. Como nas duas obras anteriormente mencionadas, a ideia, segundo o artista, é, novamente, chamar a atenção para o problema da poluição nos rios que cortam a capital paulista: “A intervenção mostra o cidadão paulistano observando a sujeira e a inutilidade que infelizmente tomaram conta dos nossos rios metropolitanos”.

Podemos perceber que Srur, um verdadeiro “poeta retocador de paisagens”, continua a levantar reflexões sociais e políticas por meio de sua inquietante arte, despertando no público reações paradoxais, mas que nunca passam em branco: “Eu trabalho com a alteração da paisagem urbana e me interessa o resultado que vai ter no espectador. Desenvolvo meu trabalho pensando na reação do outro, como ele vai reagir… Quero tirá-lo de uma anestesia e fazê-lo refletir, pensar”.

Para quem se interessar e quiser saber mais sobre o artista e sua obra, a Editora Bei Comunicação acaba de lançar o livro “Manual de Intervenção Urbana” onde Eduardo Srur comenta suas criações em seus 16 anos de produção artística, gerando uma forma particular e original de engajamento diante da experiência da vida urbana no que ela oferece como expansão ou limite ao transformar a imaginação de seus habitantes.

João Carlos Gonçalves (Joca) Doutor em Linguagem e Educação pela USP; Mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP. Professor de Fundamentos da Comunicação e Semiótica Aplicada na ESPM.