A experiência de um filme pode mudar por completo por conta de apenas uma técnica tão fundamental quanto as demais do universo do cinema, a edição.

Seja com alguns segundos a mais ou um corte mais abrupto, o poder da edição ajuda a complementar uma história da mesma maneira e potência que a narrativa ou a atuação da personagem buscam transmitir ao público.

Uma cena que aparentemente não possua relevância alguma para o filme pode mudar por completo nossa percepção e compreensão da história. A escolha de manter um take por mais tempo deixa clara a mensagem da importância daquela cena, antes vista por nós como algo normal e corriqueiro, para a construção de um significado que impacta mais ainda no filme.

Em 12 anos de Escravidão, dirigido por Steve McQueen, temos duas cenas bastante impactantes na narrativa que são intensificadas por esse estilo de edição. A primeira é quando o protagonista é enforcado por dois capatazes, mas ao invés de cortar logo para o desfecho, o diretor resolve deixar o take o mais longo possível.

O take até nos parece excessivamente longo e nos causa certo desconforto, porém esse é o propósito da cena, nos evidenciar o abuso e como aquilo soava algo cotidiano para os demais escravos da fazenda que nada fazem para ajudá-lo. Além disso, temos a luta de Solomon pela vida, seu esforço para enfrentar a morte. Essa dicotomia entre vida e morte também está presente na composição da cena na qual um lado está com casas sendo construídas e do outro lado velhas e em decomposição.

Em outra cena, o funeral de um dos escravos, temos 2 takes mais longos tanto da cantora quanto do protagonista. No primeiro, conseguimos absorver o sentimento e tristeza que está presente no rosto dela, uma vez que está cantando no funeral de um “irmão”. Quando nos deparamos com Solomon podemos ver sua batalha em busca de fé e compreensão de tudo aquilo que está acontecendo em sua vida.

Quando o diretor opta por cortes rápidos e abruptos, outra mensagem está sendo passada, a da trivialidade e quebra de expectativa.

Para os irmãos Coen em Onde os Fracos Não Tem Vez essa técnica foi a principal arma para criar uma sensação de desespero na audiência ao ponto que não compreendíamos o que estava por vir e que faltava algo, pois estamos acostumados com o padrão de: início, meio e fim.

Nas cenas em que Anton conversa com Carla e até o acidente de carro podemos ver exatamente esse efeito e como ele tem um impacto diferente ao olharmos tudo. O que conhecemos por tendências narrativas e soluções para o final são quebradas, nossas expectativas são criadas e esperamos ansiosamente por outra cena em que algo seja resolvido, porém isso não ocorre e é apenas cortado.

Antes da conversa, Carla está com receio, porém os Coen não nos mostram o que estávamos esperando, o que estava por vir é cortado para a conversa, que nos abre ainda mais questionamentos. Ao esperarmos uma saída para a conversa deles, somos cortados de novo e vemos agora Anton caminhando para seu carro, sem barulhos, olhando suas botas, sem fechamentos, ou seja, apenas cenas triviais como se nada tivesse acontecido. Porém a mensagem deixada pelos irmãos Coen é de que a narrativa clássica que conhecemos é muito artificial e que o próprio universo é injusto, afinal, Anton não foi pego.

Ao final podemos observar que o importante para o filme não é somente a história que você conta, mas a maneira como ela é contada.

Com o pé na estrada e a cabeça na lua.