Retomo o título que dei a um post há pouco mais de um mês. Naquele ocasião, tratava do aplicativo Secret e da onda de usos ofensivos que estavam sendo dados a ele.

Volto agora ao tema para falar de outra onda de ódio na redes: aquela que se seguiu à divulgação dos resultados das eleições, de domingo para segunda-feira.

A explosão foi tamanha que, como reação, começou a circular o post da imagem, além de outros do gênero.:

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‘Amar’ vem em fonte maior, como reforço sobre um fundo negro que evidencía contra o que o amor deve se afirmar.

Na segunda de manhã, inúmeros posts explodiam de raiva do resultado das eleições. A frustração pela dissonância entre os próprios votos e o que resultou das urnas. Comentários chamando os eleitores de irracionais, ignorantes, merecedores das piores consequências. Era impossível se conformar com o que se evidenciava como escolha coletiva.

O ódio era muito primário e infantil: a não aceitação dos resultados de uma eleição num Estado democrático; a ideia de se eu não entendo a razão pela qual o outro age, considero que não haja razão. Houve até quem dissesse que o país deveria trocar de povo.

Parece que a democracia só é legal quando elege nossos candidatos.

Um paradoxo notável é que boa parte do repúdio dizia respeito à eleição de figuras nefastas conhecidas pela intolerância e ódio ao outro: figuras assim eram os deputados mais votados do país.

É claro que há diferenças ideológicas e de valores entre as personagens envolvidas mas, naquele momento específico e naquela tonalidade afetiva específica, os que atacavam a eleição de gente intolerante se igualava a esta mesma gente. E usava o mesmo argumento: o “outro não é gente”.

E o patrulhamento ideológico se espalhou. Eu mesmo acabei fazendo um post comentando isto e, acho, perdi alguns amigos.

Além disto, restabeleceu-se na eleição para presidente a polaridade entre PT e PSDB, no melhor estilo torcidas fanáticas de times de futebol. O segundo turno tem um potencial grande para esta mesma relação primária.

Como a eleição é para o governo federal, tudo pode ser reduzido ao plebiscito: amor ao PT, ódio ao PT; ou Norte/nordeste x Sul/Sudeste; ou pobres x ricos. Todas estas, formas muito pobres e primárias de se relacionar com a importância do voto democrático.

Tudo indica que a gente não sabe discordar e discutir: ficamos na explosão do ódio pela diferença, ou nos refugiamos num amor incondicional defensivo, que nega estas mesmas diferenças.

As eleições assim, despertaram camadas de ódio e frustração acumuladas. Elas têm estado lá e sido constantemente alimentadas. Em alguns momentos específicos, explodem. A pergunta mais importante é sempre aquela sobre a origem de tanto ódio.

Há outras modalidades de ódio mais silenciosas. Refiro-me ao repúdio ao processo como um todo daquele contingente de cerca de 30% de abstenção. Mesmo imaginando que haja alguma defasagem de cadastro de eleitores e muita gente more longe de seu domicílio eleitoral, é muita gente. Os 42% de votos de Dilma e os 34 % de Aécio referem-se aos votos válidos; eles representam muito menos relativamente a população como um todo.

É a tal crise da representatividade que elege Tiriricas, usa qualquer meio mercadológico para chegar ou se manter no poder, nos deseduca e afasta cada vez mais do processo político.

Post Scriptum: na esteira de notícias tristes, delirantes e surreais, leio à que um grupo de médicos está pregando a esterilização dos nordestinos, eleitores preferenciais do PT. A guerra está declarada e ela vai no coração da informação. Notícias reais e plantadas vão se embaralhando e perdemos o critério de realidade.

Segundo as últimas pesquisas, Aécio está à frente de Dilma nas intenções de voto para o segundo turno, mas pela margem de erro, a Marina ainda tem chance… Serão duas semanas duras.

desanti Pedro de Santi
Psicanalista, doutor em psicologia clínica e mestre em filosofia. Professor e Líder da área de Comunicação e Artes da ESPM.

 

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