Sinapse por Pedro Hutsch Balboni, 22/09/2009 às 17h30. Semana Verde.

dia sem carro bicicleta newronio espm

Em 2007 fiquei sabendo que existia algo chamado “Dia Mundial Sem Carro”, um dia onde, teoricamente, as pessoas deixariam seus carros estacionados em casa e tentariam se locomover de alguma forma diferente da que estão acostumadas. Escrevi sobre isso. Em 2008, o tema ganhou mais importância ainda para mim, e voltei a escrever sobre isso. Hoje, 2009, 22 de setembro, Dia Mundial Sem Carro, tenho a oportunidade de resgatar o assunto aqui no Newrônio.

Tentarei ao máximo me desapegar de convicções individuais e me basear em fatos. Temos, hoje, mais carros do que ruas em São paulo. Isso quer dizer que não existe espaço físico suficiente para todos os carros da cidade andarem ao mesmo tempo – o que faz um tremendo sentido. Segundo consta no Blog do Nauta, sobram 129 veículos para cada quilômetro. Já há um bilhão de veículos no mundo – com a velha estimativa de 6 bilhões de seres humanos, temos que uma em cada seis pessoas tem seu carro (lógico, estou ignorando neste raciocínio as disparidades sociais).

 

 

Com o barateamento crescente de produtos, temos um maior acesso a eles, o que significa inclusão social mas também significa aumento no consumo – e este último significa uso de recursos naturais. Da mesma forma que acontece com todos os produtos, o carro está cada vez mais barato. Em março deste ano, foi lançado na Índia o Tata Nano, o carro mais barato no mundo, custa cerca de US$2.000 dólares. Apesar de ser mais eficiente em aproveitamento de combustível, fazendo 23 km por litro, o que é preocupante é a escala de novos donos de automóveis que surgirá. Note como é ambíguo: de um lado temos um problema social, onde a maioria da população não tem acesso aos mesmos produtos; do outro temos a insustentabilidade de todos terem tudo (provada, inclusive, neste quiz da WWF, que têm o propósito de dizer a você quantos planetas Terra você consome com seu life style). E a produção em escala, solução e segurança de lucro para o fabricante, acaba pesando nas costas do planeta.

Soluções que pesam menos para o planeta existem, e estão prestes a se tornar economicamente viáveis (o que pode ser traduzido como “agora sim vai acontecer!”). O segundo homem mais rico do mundo, Warren Buffet, comprou 10% de uma empresa chinesa, a BYD, fundada pelo engenheiro químico Wang Chuan-FU, por US$230 milhões de dólares. O fato chamou também a atenção da Volkswagen. A aposta é na produção de carros elétricos. O grande fator limitante que havia para o negócio de carros elétricos era a chamada “angústia do alcance”, ou seja, a bateria nunca durava o suficiente para as pessoas fazerem seus percursos. Wang conseguiu vencer esta barreira com suas baterias, que fazem cerca de 100 quilômetros com carga completa (o veículo custa US$22 mil no mercado chinês), e está indo mais longe; produziu um fluído atóxico para suas baterias,  que costuma colocar num copo e beber para provar o comprometimento que tem com o meio ambiente. Está em seus planos produzir essas baterias de forma totalmente reciclável.

 

 

Outro tipo de solução para a “angústia do alcance” está sendo abordada por outro camarada de peso, o israelense Shai Agassi. Para ele, ao invés de deixar o carro recarregando na tomada durante a noite por 8 horas todo dia, deveríamos ter sim uma bateria recarregável mas que também pudesse ser trocada num posto em poucos minutos. Ele já recebeu mais de US$300 milhões de dólares de investidores de risco para criar suas baterias e as redes de postos para trocá-las, o que significa “vai acontecer!”. (Fonte: Revista Época)

 

Carro ecologico newronio espm

 

Outros carros para minimizar o efeito estufa existem, estão sendo inventados, estão sendo testados. Um exemplo é o Pac Car II, que tem capacidade de rodar 5.385 quilômetros com o equivalente a apenas um litro de gasolina. Não vou falar dos carros solares ou movidos a hidrogênio, pois eles são realidade, mas economicamente ainda não estão prontos para ir às prateleiras; a Fiat tem uma proposta diferente com o Panda Aria, que apesar de não apresentar muitas inovações quanto ao combustível que utiliza (apesar de o rendimento ser ótimo, 29,4km/litro), apresenta uma série de cuidados na hora de sua fabricação. Sua carroceria, por exemplo, é feita de uma resina ecológica semitransparente. Já é um avanço maior do que queimar álcool ao invés de gasolina.

Agora, o leitor atento já viu logo no segundo parágrafo que o problema não é exatamente esse. Nem se todos tivessem um carro deste aqui os problemas estariam resolvidos. Há carros demais, veículos que pesam toneladas levando pessoas que pesam 70 quilos para lugares próximos e comuns a todas elas. O transporte público se mostra como uma solução muito mais sensata para os problemas que criamos com nossas metrópoles. Carros ecológicos são necessários, mas não são a solução para este tipo de problema. Pensar em carros e não em transporte é pensar em uma solução de curto prazo para um problema de longo prazo.

 

transporte publico newronio espm

 

Ao invés de se investir dinheiro público para construir mais pistas nas marginais em São Paulo, por que não investir em transporte público? Aumentar o número de pistas nas cidades é uma solução tática, não estratégica. Além do mais, já mostramos estudos aqui no blog provando que o trânsito não tem causas, é apenas mais uma peculiaridade humana.

É necessário criar infra-estrutura na cidade para mudar a cultura das pessoas em relação ao transporte. Em Londres foi assim: o trânsito era caótico, até que os responsáveis pelo planejamento da cidade decidiram priorizar as pessoas ao invés dos carros. Implantaram um sistema de transporte público tido como exemplo para o mundo todo e tornaram o transporte em carros absurdamente caro dentro da cidade, de modo que apenas quem tinha muito dinheiro podia ficar andando de carro por aí.

Hoje é dia o Dia Mundial Sem Carro. E o trânsito está parado. 73 quilômetros de lentidão as 8h30 em São Paulo, número próximo da média normal. Tudo bem que o dia está chuvoso, mas não dá pra ficar usando essa mesma desculpa nos outros 364 dias do ano.

Twitter @phbalboni @newronioespm