A carreira de publicitário é reconhecidamente uma das que mais distingue seus profissionais. E essas distinções vão desde medalhas e certificados aos mais variados troféus nos inúmeros festivais mundo afora. Sem nenhum demérito aos demais festivais de publicidade existentes no mundo, é inegável que a melhor tradição criativa conferiu ao Festival de Publicidade de Cannes o status distintivo de “o” Festival de Publicidade no mundo. Inaugurado em 1954, com o objetivo de premiar comerciais em um evento que ocorria logo em seguida ao famoso Festival de Cannes que premiava os melhores filmes de cinema, o Cannes Lions International Festival of Creativity mudou de nome, se reinventou e continua firme e forte reunindo a nata do mundo publicitário.

O simples fato de estar em Cannes, mesmo que não se esteja competindo, não deixa de ser uma oportunidade única para os publicitários do mundo todo. É o meu caso. Mesmo sem estar competindo, não deixa de ser verdade que já “ganhei” meu Leão simplesmente por estar aqui representando a ESPM, escola pela qual me formei publicitária em 1981 e na qual sou professora há quase 20 anos. Para mim, é uma honra e uma responsabilidade estar presente nesse evento de relevância internacional.

Historicamente e das mais diversas formas, a ESPM esteve presente em todas as edições do Cannes Lions. A escola já patrocinou áreas específicas do Festival e já enviou inúmeros professores e coordenadores de cursos para pesquisas do estado da arte da publicidade internacional. Mas, sem dúvida alguma, a forma mais relevante da participação da escola no Festival é ter a presença de muitos de seus ex-alunos nas fichas técnicas de trabalhos premiados. Ano após ano a Alumni da escola faz o levantamento do número de ex-alunos que constam entre os profissionais premiados e este número é sempre bastante expressivo. Neste ano, o Brasil trouxe para casa 101 Leões (2 a mais que no ano passado) e tenho certeza que em muitos deles há ex-alunos na ficha técnica. (Veja o quadro de número de trabalhos brasileiros inscritos/premiados ao final.)

Outra forma de a escola se sentir representada é ver um/uma estudante vencendo o competitivo concurso Young Lions, que como o próprio nome diz, seleciona jovens profissionais a partir da distinção de seu portfólio, com até 30 anos e 2 anos de mercado. Neste ano, vários jovens profissionais brasileiros que integraram a delegação do Young Lions 2018 são ex-alunxs.

A escola também é uma presença constante na Roger Hatchuel Academy que acontece no Festival. Neste ano a estudante que representou a escola nesse privilegiado grupo foi a Caroline Volpato Teixeira.

CANNES LIONS E SXSW – Há alguns anos, os publicitários, principalmente os mais jovens, passaram a comparar o Cannes Lions com o SXSW, sugerindo que o Cannes Lions estaria ficando datado. Entretanto, precisamos tomar cuidado com as comparações, pois o SXSW, festival criado em Austin, Texas, Estados Unidos, celebra a convergência das indústrias interativas de filme e música. Para pensarmos juntos: talvez o Cannes Lions tenha sido comparado ao SXSW quando passou a se auto denominar como “festival de criatividade”. E, essa estratégia de usar a palavra criatividade no lugar da tradicional palavra publicidade, talvez tenha aberto espaço para esse tipo de comparação. Na própria home da página – lovethework.com – que traz todos os trabalhos que venceram o Cannes Lions deste ano, vemos a frase: “Celebrando a criatividade desde 1954”, ainda que todos nós saibamos que o conceito “criatividade” associado ao nome do Festival tenha entrado muito tempo depois.

Fato é que há anos a publicidade, como um dos mais atuantes registros da cultura moderna, vem convergindo com áreas afins, como o vídeo, a música, o entretenimento. Publicidade é cultura, sim, em um registro diferente da música, das artes, do vídeo e do entretenimento, que, aliás, muito se beneficiam das contribuições da publicidade. E essa convergência tem no formato do brand content um de seus melhores exemplos. Mas é imprescindível pensar que no mundo do Cannes Lions há sempre uma marca por trás dos trabalhos premiados. E no SXSW os trabalhos têm a marca de artistas, e todos nós sabemos o desafio que é integrar de forma orgânica a marca de um produto de consumo, ou até mesmo de um serviço, a um conteúdo que o público entenda como relevante.

CANNES: CATEGORIAS E SUBCATEGORIAS – Como se sabe, uma das criticas ao Cannes Lions sempre foi o número de categorias e subcategorias. Com tantas possibilidades de inscrição, muitos trabalhos passaram a competir em várias categorias simultaneamente. Se, por um lado, em múltiplas categorias, os trabalhos têm mais chances de serem premiados, por outro, o Festival acaba sendo criticado porque esse procedimento parece possibilitar uma fonte extra de recursos financeiros para o próprio Festival, uma vez que cada inscrição custa centenas de euros. De qualquer forma, nos parece que na tentativa de diminuir as criticas sobre o excesso de categorias, a edição de 2018 do Cannes Lions foi remanejada e contou com 9 categorias:

1) Communication, com as seguintes subcategorias: Film, Radio & Audio, Print, Outdoor, Design, Mobile e Titanium. Pode-se dizer que até pouco tempo atrás essas subcategorias de Communication eram todas as categorias do Festival de Cannes. Estamos falando de uma época em que o Festival ainda não adotava o aposto de criatividade. Ou seja, ele era visto especificamente como um festival de publicidade. E essas subcategorias de Communication davam conta dos formatos e mídias existentes até então. Talvez não seja à toa que essa categoria é a primeira que aparece no catálogo impresso entregue no evento.

2) Craft – a categoria que privilegia a estética dos trabalhos inclui 3 subcategorias, Industry, Digital e Film. O detalhe desse ano é que a subcategoria Film Craft Lions foi patrocinada pelo Film Brazil que, aliás, comparecia com um enorme outdoor no alto do Palais.

3) Entertainment – como aparece no descritivo do catálogo impresso, é a categoria que premia “grandes histórias numa época de pequena atenção”. No passado, Cannes Lions premiou trabalhos de anunciantes que geravam entretenimento ao público, em outras categorias, como o caso clássico do bmw.films, trabalho que ganhou o grande prêmio em Digital e acabou sendo o motivo da criação da categoria Titanium posteriormente. A categoria Entertainment deste ano contou com 2 subcategorias, Entertainment e Music.

4) Experience – categoria que premia trabalhos que privilegiam boas ativações na experiência de compra. Neste ano, Cannes apresentou uma novidade: além da subcategoria Brand Experience Activation, tivemos a subcategoria Creative ecommerce.

5) Good – é interessante o fato de o Festival ter organizado nesta categoria os trabalhos que pretendem “deixar o mundo melhor”. Historicamente, os trabalhos da chamada “publicidade do bem” se espalhavam por várias categorias. Há alguns anos, Cannes introduziu a categoria “Glass”, que cresceu e apresentou trabalhos de especificidades que não comportavam mais a demarcação do Glass, a ponto de este ano a categoria Good ter duas subcategorias: Sustainable Development Goals e Glass: the lion for change.

6) Health – essa categoria é praticamente um “subfestival”, um Festival dentro do Festival. Além de premiar trabalhos em que a “criatividade tem o poder de literalmente salvar vidas”, como descrito no catálogo, o Cannes Health traz uma série de palestrantes em torno do tema Healthcare, ou seja, saúde e cuidados pessoais. Neste ano, o Health foi dividido em Health & Wellness e Pharm.

8) Impact Lions – categoria criada para mostrar trabalhos em que a criatividade realmente impactou em negócios para o anunciante. Quando criada, ela recebeu o nome de Creative Effectiveness. E atualmente, embora tenha trocado de nome, mantém o termo Effectiveness como o nome de uma única subcategoria. Essa categoria premia trabalhos que venceram em categorias de criatividade e posteriormente mostraram que as campanhas resultaram em ganhos mensuráveis para os anunciantes. Como bem disse Nick Law, global chief creative officer Publicis Groupe e presidente do júri de Creative eCommerce Lions: “We should never forget that, if we do our job well, it ends with someone buying something”.

9) Innovation – esta categoria celebra “ground-breaking innovation and problem-solving campaigns or designed objects”. Há alguns anos, Cannes introduziu a categoria Design. Atualmente, esta categoria organiza os trabalhos entre Innovations e Product Design.

9) Reach – os painéis relacionados a essa categoria, nomeada de Reach Track, deram conta de trazer especialistas para falar de mídia paga e mídia espontânea. Os trabalhos vencedores foram organizados entre 5 subcategorias: Creative Data, Social & Influencer, PR, Direct e Media.

QUADRO DE TRABALHOS BRASILEIROS INSCRITOS/PREMIADOS (*)

Subcategoria Trabalhos brasileiros inscritos Trabalhos brasileiros premiados
Brand Experience & Activation 149 5 Prata + 3 Bronze
Creative Data 69 1 Bronze
Creative E-commerce 24
Creative Effectiveness 9 1 Bronze
Digital Craft 58 1 Ouro + 4 Bronze
Direct 201 1 Ouro + 4 Prata + 6 Bronze
Entertainment 61 2 Prata + 2 Bronze
Entertainment for Music 25
Film 72 1 Ouro + 1 Prata + 4 Bronze
Film Craft 117 1 Prata + 2 Bronze
Glass 20 1 Prata + 1 Bronze
Health & Wellness 107 2 Prata + 1 Bronze
Industry Craft 82 3 Bronze
Innovation 15 1 Bronze
Innovation Design 66 3 Prata + 5 Bronze
Media 164 1 Ouro + 3 Prata + 3 Bronze
Mobile 53 1 GP + 1 Ouro + 1 Bronze
Outdoor 217 1 Ouro + 4 Prata + 7 Bronze
Pharma 18 1 Prata
PR 131 2 Ouro + 2 Prata + 6 Bronze
Print 198 1 GP + 1 Ouro + 8 Bronze
Product Design 32
Radio 44 1 Bronze
Social & Influencer 117 1 Prata + 2 Bronze
Sustainable Development Goals 77 1 Prata + 1 Bronze
Titanium 5

(*) Quadro feito a partir de informações obtidas em clubedecriacao.com.br.

Por Profa. Dra. Maria (Matuck) Abranches

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