Vivemos hoje um momento de crise. Nunca tivemos acesso a tantos produtos e facilidades e, paradoxalmente e ao mesmo tempo, nunca fomos tão infelizes. Como funciona essa mecânica?

Primeiro, diz-se que vivemos em uma sociedade de consumo, em que o objetivo maior de nós, como cidadãos, é consumir. É consumindo que validamos nossa existência, afirmamos nossa identidade, viabilizamos nossa entrada em determinado grupo social. É difícil traçar a origem dessas práticas, mas muitos concordam que pode ser delineada no pós guerra, com a ascensão dos Estados Unidos e seu modelo aspiracional, o chamado american way of life.

Característica desse american way, a busca pelo novo e o descarte do antigo são reflexo de uma sociedade que buscava se distanciar de seu passado histórico, manchado por duas guerras sangrentas e, característica fundamental para seu diferenciamento de outras guerras anteriores, transmitida quase que em tempo real para todo o mundo  através da tecnologia do rádio. Quase todo mundo sabia de tudo que acontecia no front, e poucos se sentiam realmente confortáveis com isso.

As Guerras geraram muita insatisfação, tristeza e dor. Se livrar dos objetos que remetiam à esses sentimentos parecia a coisa certa a se fazer. Mas a coisa parece perder o control. Empresas passam a adaptar seus produtos para que seu tempo de vida seja menor. A propaganda que apenas apresenta as qualidades dos produtos vai se tornando redundante, irrelevante. É preciso trazer valores exteriores ao produto a fim de torná-lo desejável ao consumidor.

Oras, era assim que Edward Bernays já trabalhava com seus anúncios desde a década de 1930: apresentava uma situação ideal uma personagem modelo, como consequência do uso (ou até mesmo somente da compra) dos produtos. Cria-se assim o campo idealizado da propaganda, anunciantes procuram cada vez mais um maior grau de “perfeição” para seus personagens.

Aspectos estéticos, sociais e familiares criados pela propaganda vão sendo tomados não como um ideal para os usuários dos produtos, mas antes acabam por, como que por repetição, tornarem-se ideais de toda uma sociedade. Tal qual a máxima de Goebbels, de que uma mentira repetida mil vezes torna-se uma verdade, esse ideal fantástico de homem. mulher ou família, se torna o objetivo a ser alcançado por todos.

A diferença entre o que é apresentado e buscado e a realidade não é pequena: cria-se um objetivo que jamais pode ser alcançado mas ao mesmo tempo é cada vez mais cobrado por todos e de todos. É necessária a vida que busque atingir tal patamar. O constante desejo de se ajustar à essa sociedade opressiva parece encontrar mas promessas da propaganda uma cura segura, uma saída sem danos.

Mas nenhum produto entrega essa satisfação, menos fruto de uma realidade subjetiva individual e mais fenômeno social, impossível de ser combatido com ações individuais e imediatas (como, no caso, o consumo). Nasce assim a frustração de nossa época, em que todos desejam o que não têm, se frustram ao não serem capazes de obtê-las e sentem-se afastados do grupo social ao serem pressionados para continuar com esse ciclo, com o risco da exclusão caso não demonstrem ao menos seguir esses preceitos.

É nesse cenário que a arte, válvula de escape do descontentamento da sociedade, meio de expressão daqueles poucos corajosos que possuem maior sensibilidade e percepção de todo o mecanismo de opressão, retoma seu papel de crítica e protesto.

Subvertendo os meio pelos quais a propaganda é veiculada, o mais recente e bem-sucedido movimento artístico de revolta, denominado Brandalism (Brand=marca + Vandalism=vandalismo). Contrário ao que se espera da associação com o vandalismo, a quebra e depredação de propriedade pública e privada, o movimento tem uma atuação um tanto menos violenta e bastante mais interessante.

Escondendo-se em plena vista, disfarçado de funcionários de manutenção das mídias utilizadas, os participantes do Brandalism trocam outdoors publicitários por arte. No último levante, ocorrido agora em maio, a arte de 40 artistas tomou o lugar de mais de 365 espaços, espalhados em 10 cidades britânicas, em apenas 2 dias.

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Segundo o manifesto do movimento, seu objetivo é retomar o ambiente público que foi invadido pela propaganda ofensiva. Em suas palavras: “Não é um movimento por desejar menos, devemos é desejar mais da vida. A questão é: desejar mais do quê?”

Minha barba. Minha vida.